Vídeo engana ao sugerir tratamento “sem internação e sofrimento” para covid

22 de Maio de 2020

O vídeo postado por Silvana Conte, que admite não ser médica, em seu canal no YouTube confunde ao dizer que há medicamentos que curam a covid-19 e impedem a evolução da doença para fases mais graves caso sejam receitados no início dos sintomas. O material mistura dados falsos e verdadeiros sobre os remédios atualmente indicados para tratamento e contém informações sem comprovação científica. Há também ataques contra as medidas de isolamento social utilizadas para reduzir a velocidade de contágio da doença e acusações à profissionais de saúde e hospitais de serem negligentes.

Primeiramente, até o momento, não há medicamento que cure a doença. Alguns estão sob testes clínicos, mas ainda não apresentaram eficácia contra o vírus em concentração que não seja prejudicial à saúde. Além disso, especialistas ressaltam que entre 80% e 85% dos pacientes infectados pela covid-19 serão assintomáticos ou terão sintomas leves —- semelhantes aos de uma gripe —, portanto não precisarão ser submetidos a medicações que podem causar efeitos colaterais. O acompanhamento médico é essencial principalmente para o grupo de risco, aquelas pessoas que podem evoluir para uma forma mais grave da doença e terão de ser submetidas a tratamentos de suporte como o uso de oxigênio.

Sobre a “necessidade de tratar pacientes leves com medicação para impedir que os sintomas se agravem”, Guilherme Spaziani, médico do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, explica que as complicações decorrem de uma inflamação exacerbada cujas causas ainda são investigadas. Esse quadro de evolução da doença é observado principalmente nas pessoas do grupo de risco, como idosos, cardiopatas e obesos. Gerson Salvador, médico infectologista do Hospital Universitário da USP e associado da Sociedade Paulista de Infectologia, ressalta o perigo de pessoas usarem uma grande quantidade de medicamentos. “Quando a pessoa usa um número grande de medicamentos de maneira desorganizada, aumentam as chances de efeitos adversos, que podem ser graves dependendo da condição de saúde da pessoa. O que recomendamos é o tratamento sintomático para casos leves e tratamento de suporte para casos graves”.

A seguir, quatro afirmações realizadas por Silvana Conte são explicadas:
(1)Protocolo do Ministério da Saúde abrange orientação sobre sintomas mais leves e graves
Diferentemente do que sugere o vídeo de Simone Conte, o Ministério da Saúde não fala em “esperar pela falta de ar” para tratamento. Pelo contrário, ressalta a importância do acompanhamento de quem apresenta os sintomas leves, principalmente pessoas com mais de 60 anos ou com outros fatores de risco. A entidade orienta para o seguimento do tratamento domiciliar com monitoramento médico por telefone a cada 24 ou 48 horas, inclusive para casos não confirmados.

A versão atualizada do protocolo, disponível no site do Ministério, detalha como deve ser a ação médica e como as Unidades Básicas de Saúde devem trabalhar, dos casos com sintomas leves aos graves. Na página 17, tem uma sugestão de prescrição de dipirona e paracetamol, medicamentos analgésicos que aliviam sintomas como dores no corpo, mal-estar e febre, mas sem propriedades de cura. Há ainda o remédio oseltamivir, um antiviral usado para combater o vírus da gripe. Seu uso, porém, é encerrado quando o teste de gripe dá negativo ou quando o da covid-19 dá positivo, já que ele não tem ação comprovada contra o novo coronavírus. São determinadas ainda medidas de suporte e conforto, isolamento domiciliar e monitoramento até a alta médica. O protocolo de uso da hidroxicloroquina foi acrescentado na quarta, 20, e diz que, até o momento, não há dados científicos que apontem um determinado tratamento farmacológico e que seu uso está condicionado à decisão do médico e à autorização por escrito do paciente. O protocolo também fala de contra indicação em pacientes com doenças cardíacas, como a comunidade científica vem ressaltando há tempos.

(2) Recomendação na Itália é tratamento de sintomas e cuidado com hidroxicloroquina
O vídeo sugere que médicos italianos que usaram hidroxicloroquina em pacientes no início dos sintomas tiveram sucesso com a redução de internações na Itália. De fato, o medicamento está entre aqueles com uso autorizado no país, inclusive para pacientes com sintomas leves e em tratamento domiciliar. No entanto, a Agência Italiana de Fármacos alerta para a importância de que a hidroxicloroquina seja receitada por um médico e com autorização do paciente, por se tratar de medicamento sem eficácia científica comprovada. A entidade também alerta para seus efeitos colaterais cardíacos e os perigos de sua utilização em altas doses em cardiopatas. A principal orientação do Ministério da Saúde italiano sobre o tratamento de covid-19, atualizada em 11 de maio, é similar à feita no Brasil: cuidar dos sintomas apresentados pelos pacientes com terapias de suporte, como uso de oxigênio; descansar; continuar isolado em casa; comer bem e beber bastante água.

(3) Isolamento não salva vidas?
O infectologista Guilherme Spaziani diz que caso não seja encontrada uma vacina, o mesmo número de pessoas será infectado com ou sem a adoção do isolamento social. No entanto, a medida de distanciamento evita que as pessoas sejam contagiadas em um curto espaço de tempo e, com isso, sejam esgotados os recursos hospitalares, médicos e de insumos necessários a um suporte adequado. Isto é, o isolamento social permite o serviço hospitalar para cada paciente, inclusive aqueles que estiverem em estado grave.

(4) Medicamentos citados não combatem o coronavírus
Especialistas ressaltam não haver um remédio que cure a covid-19. Por isso, é importante o cuidado na divulgação de um determinado tratamento. O vídeo cita diversos remédios que vão de antibióticos (contra bactérias) a remédios usados para tratamentos antiparasitários (contra vermes). A covid-19 é uma doença causada por um vírus. Gerson Salvador, infectologista do Hospital Universitário da USP, ressalta que o passo a passo de orientação médica depende de cada paciente e que é importante que o médico fique atento principalmente a doentes com fatores de risco.


Fonte: UOL
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