Há conversação em sua aula online?

16 de junho de 2020

O fechamento de escolas e universidades de maneira repentina, uma decisão tomada pelos governos do Brasil e de vários países afetados pela COVID-19, pegou de surpresa muitos professores que, em caráter de urgência, estão precisando construir saberes pedagógicos específicos para a docência em modalidades não presenciais de educação (PIMENTEL; ARAUJO, 2020). “Terei de dar aula online, e agora, o que faço?”

A dúvida mais recorrente é: que sistemas computacionais usar? Temos acompanhado, pelas nossas redes sociais, rastros das atividades docentes realizadas por diversas tecnologias digitais em rede, seja para dar aulas online, seja para realizar trabalhos em grupo, orientações, reuniões de grupos de pesquisa, defesas de trabalho de conclusão (TCC/dissertação/tese), entre outras atividades. Temos observado um intenso uso de videoconferência neste atual momento, por Zoom (©Zoom Video Communications), Skype (©Microsoft), HangOuts (©Google) ou Messenger (©Facebook), entre outros sistemas computacionais. Essa predileção pelo uso da videoconferência talvez se dê por este ser o meio que mais se aproxima da conversação face a face que estamos acostumados na modalidade presencial.

Com a contingencial transposição do presencial para o online, as instituições e os professores estão compartilhando experiências e práticas de aprenderensinar online. Algumas questões surgem: Quantos alunos devem participar das reuniões online? Os alunos presentes na reunião constituem uma parte significativa da turma? O sistema computacional adotado é adequado? A interação pode ser gravada para posterior consulta (direitos de imagem)? Que outros meios de comunicação devem ser mobilizados (chat, fórum etc.)? Como usar esses meios? E por aí vai.

Após as primeiras vivências de docência online, outros questionamentos emergem, especialmente os relacionados à interação que se estabelece pelas ambiências digitais. Deve o professor ficar disponível para tirar dúvidas? Se for realizar uma dinâmica em grupo, o que o professor deve fazer para não ficar falando sozinho? O que fazer quando os alunos demonstram apatia, quando não querem conversar? Qual é a atitude esperada dos alunos nesses espaços? O que fazer para promover a interatividade?

Neste texto, queremos refletir sobre essas questões e apontar a importância da concepção de uma ambiência conversacional na educação online. Se algo precisa ser muito bem planejado, nessa modalidade, é a conversação.

A transposição da aula presencial para a internet tem acontecido de forma síncrona (em tempo real) via interfaces de web-conferência. Os professores têm convocado seus alunos para o encontro, respeitando os mesmos dias e horários de suas aulas presenciais. Esta solução tem atendido, na medida do possível, as exigências institucionais. Por outro lado, “o falar ditar do mestre” é a regra na maioria dos casos. Mesmo assim, há casos mais dialógicos acontecendo… Além disso, tem despertado em muitos professores um grande bem-estar, aquilo que José Armando Valente (Unicamp) chamou um dia de “estar junto virtual”. Por outro lado, o investimento no síncrono tem funcionado melhor na pós-graduação e nas escolas e universidades privadas, uma vez que a “inclusão digital” é maior. Em muitas realidades, não temos como trabalhar de forma síncrona. Apesar do acesso a rede ser um “Direito Humano/UNESCO”, somos um país de exclusões sociais enormes, dentre elas a “exclusão cibercultural”, ausência de acesso às TIC e processos formativos em cibercultura. Além disso, a educação online mais interativa e inclusiva, deve contar sobretudo com a “Didática do Assíncrono”, com desenhos curriculares online mais interativos (Santos e Silva, UFRRJ, UERJ). A comunicação síncrona, garante sim um sentimento de pertença enorme. Faz nosso coração disparar, promove e forja “vínculos”. Por outro lado, permite pouca interatividade. Cocriar a mensagem requer conversa online. Requer tempo para pensar sobre questões, permitindo uma comunicação todos-todos. O uso de interfaces assíncronas, democratiza sobremaneira a educação online. Continuemos investindo no síncrono interativo (menos um-todos), seja por video-conferências, seja por salas de bate-papo (chat) (SANTOS, 2020)

Quando nos referimos à conversação, não estamos nos referindo à exposição de conteúdos pelo “ditar do mestre” em que os alunos só podem falar para tirar dúvidas sobre o que foi exposto – isso não caracteriza uma conversa genuína. Estamos nos referindo à conversação aberta para o imprevisível e que se realiza na interatividade com os alunos e entre eles, como apontou Paulo Freire (1970, p. 48): “A educação autêntica, repitamos, não se faz de ‘A’ para ‘B’ ou de ‘A’ sobre ‘B’, mas de ‘A’ com ‘B’, mediatizados pelo mundo.” Quando não há conversação, estamos produzindo outras coisas: videoaulas, tutoriais, conteúdos online, recursos educacionais, entre outras denominações. Conteúdo também é importante, mas estamos chamando a atenção para a importância de se planejar a ambiência conversacional das aulas e realizar a mediação docente necessária para promover a conversação e mantê-la produtiva e prazerosa em uma turma online (RIBEIRO; CARVALHO; SANTOS, 2018). Para a efetivação da educação online, Santos e Silva (2014) ressaltam a importância da interatividade, o que se realiza por meio de autoria e conversação (mas não unicamente), sobretudo pela conversação todos-todos, seja de maneira síncrona ou assíncrona.


Fonte: SBC Horizontes
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